quinta-feira, 9 de abril de 2009

"...convido todos a mandar a MTV tomar no cu."

*** Continuação...

Hora de entrar. Nosso grito ecoa no camarim, um urro gutural sem muito sentido, um grito primal como é o próprio rock. Não tem vídeo com texto do Baudelaire e nem sequer meu áudio gravado declamando pra introduzir a bagaça.

Três, quatro e os primeiro acordes de Cubanajarra começam. A galera canta. A bateria marca o ritmo e eu entro fazendo cena, com os braços cruzados atrás das costas, caminhando como um capitão de navio preocupado com uma abordagem. Simbora. To meio bebão e procuro concentração pra não trocar os dias da semana da letra. Ta um calor infernal e eu to de casaco. Torço pra primeira música acabar logo, pois aí eu jogo peruca, bandana e casaco no chão e digo:

- Boa noite. Temos orgulho de ser a maior banda independente do Brasil. Nós somos as Velhas Virgens.


Foi assim. Tuca puxou “Rafaela eu amo a sua mãe” e vamos na doideira. Na hora do solo eu arrebento a lata de Heineken na testa. Eles gostam e eu adoro. Pra mim o show começa agora. A música baixa e eu cito um trecho de “Rehab”, da Amy Winehouse, convidando a massa a responder “no, no, no”! Muito legal. Os sons vão se seguindo. To particularmente com vontade de falar hoje e convido todos a mandar a MTV tomar no cu. Batata! Passamos por “Muito bem comida”, “Tudo que a gente faz é pra ver se come alguém” e “Tequila”. Que calor do caralho. Agora eu lembro da lojinha sob o comando de Edu “Viado”. E cedo meu lugar pra nova mulher do diabo, Juliana Kosso. Ela toca a parada e eu vou me trocar.

Deixei uma latinha aberta de Heineken estrategicamente na janela do banheiro. Enquanto mijo, dou uns goles. Ainda ta gelada. Já tirei a bermuda preta, bota e tudo mais. All Star preto no pé direito, All vermelho no pé esquerdo. Cueca do timão. Sutiã vermelho que vai por baixo do roupão preto. Mickey Rourke tem dificuldade de me ajudar a por o sutiã. Eu reclamo e ele diz que sabe mesmo é tirar. Corno! Juju acaba e volto pra lá. Ela ta com a movimentação meio limitada pois trincou uma costela na volta de um show anterior. Ok. O roupão preto triplica o calor em “Mea Culpa”. Quando acaba posso mostrar o sutiã pra “Um Homem lindo” que eu ofereço pro Ronaldinho Gordo. Em Mea Culpa eu brinco com as torcidas adversárias. O corinthianos adoram e os outros protestam. Antes de começar “Um Homem lindo” alguns torcedores bambis começaram a ensaiar um grito de “tricolor, tricolor”. Eu aproveito que to vestido de gay e canto com eles. Eles ficam putos e a galera ri. Eu amo muito tudo isso.

Cavalo puxa “Siririca Baby” e é a catarse de sempre. Em Blues do Velcro Juju insinua um rolo com a mocinha loira da qual eu roubo um tênis onde bebo alguns goles de cerveja. Não contente, me abraço nas duas e jogo cerveja sobre o trio. Funny. Juju saiu e nem percebi que pulei “Madrugada e Meia” devido ao excesso de chapação. Chamei um blues meio que de improviso. Calor animal. Roy puxa o blues e eu vou até o camarim me refrescar. Encontro Cavalo fazendo a mesma coisa. Volto e canto:

“Eu encontrei a mulher que eu quero, mas ela não me quer

eu encontrei a mulher que eu quero, mas ela não me quer

As que me querem eu não quero e é assim que esta filha da puta de vida é.

Eles dizem que eu bebo demais e que eu não tenho coração

Eles dizem que eu sou um filho da puta e que meu time acabou de voltar da segunda divisão.

Ser corinthiano nada tem a ver com ganhar ou perder. É amor. É paixão”.


Ao fim disto, Roy puxa “Abre essas pernas”. Aí Tuca me lembra que pulei Madrugada e Meia. Ok, façamo-la. Depois é Uns Drinks e c’est fini!

Entramos todos esbaforidos no camarim pra esperar o bis. Roy ta vomitando no banheiro. Todos estão passando mal de tanto calor. Coloquei minha batina e quero voltar. Cavalo me segura e manda deixar o povo pedir. Nosso roadie puxa o famoso “bota pra fuder”. Eu volto de padre e digo pras pessoas que pelo mundo tem um monte de falsos embaixadores de Deus. Um monte de puxa sacos de Jesus que se autodenominam intermediários da salvação. O problema é que eles constroem templos que caem na cabeça dos inocentes. Minha igreja é o bar, pois eu nunca vi buteco desabar. Pronto, começa a reza e depois Deus é pai e a cachaça vai.

Na seqüência aviso que a gente vai tocar em dois palcos na Virada Cultural, inclusive no palco do Toca Raul. Eu explico que serão tocados todos os discos do Raul, na ordem, incluindo todas as canções. E que nós vamos tocar o Abre-te Sésamo. Então, como não temos nenhum problema de tocar Raul quando a galera pede, vamos começar a mostrar um pouco do que recriamos nas canções do Raul agora. Rola a versão pesada de “Só pra variar”. Depois eu arrisco pela primeira vez e sem a letra na mão “Eh Meu Pai”. Erro alguns versos, mas a levada meio macumbistica contagia a galera que atende meu pedido e bate palmas no ritmo. Nossa versão é mais hendrixiana e faz sucesso. É a primeira vez que fazemos essa num show.

Chamo Ju, improviso o Gary Moore em Aluga-se e jogo o B.O. na mão dela. Ela canta e a galera vem junto. Peço pro técnico de luz apagar os refletores e nos deixar no escuro, pois ninguém mais agüenta o calor no palco. Roy sai pra vomitar mais uma vez. Pra terminar, “A minhoca que acendia o rabo e Beijos de corpo”. Nosso abraço fraternal, agradecimento e acabou o calor, porra. Duas horas de show, me diz Mickey Rourke.

To sentado na privada, tentando respirar. Quando consigo, ouço Juju dizendo que sua movimentação ficou prejudicada pela dor na costela. Eu lembro a ela que só há dois tipos de shows: os que tem briga no final e os que não tem. Como não brigamos, o show foi bom. Já recuperado, abraço Banas que só com seguiu chegar ao camarim agora. Ele me informa que a casa estava super lotada com mais de seiscentas pessoas e que teve que mandar mais de cem pessoas embora por falta de espaço. Ele me consegue mais uma cuba e cervejas skol, desta que parece uma lata de energético. Coloco uma em cada bolso e vou bebendo minha cuba e uma breja. Enfio toda a roupa dentro da mala. Rola um papo amigável no camarim. Através da janela do banheiro troco idéias com Zé Paulo e sua esposa. Não ouço direito o que eles falam.

Simon e Lu querem ir embora e perguntam se vou com eles. Claro. Saio arrastando minha mala que é tomada de minha mão por Rodrigo Beduíno que tenta me ajudar. Levo mais de meia hora pra passar pelas fotos, abraços, beijos e autógrafos de quem está na fila quilométrica para pagar. Pobre Rodrigo que desiste de me esperar. Lá fora Simon e Lu tb estão desolados. Sorry, preciso dar atenção pra todo mundo e agradecer este apoio. Diego Basanelli, Tutty, Anjo e algumas figurinhas carimbadas recebem afagos mais demorados. Pronto. Sai do Aurora. Tenho duas brejas nos bolsos e vou bebendo no trajeto. Lu ta na direção e ta doidona, mas o que ela ingeriu não aparece em bafômetro. Os dois me deixam em frente da Gabaju.

Ligo meu carro e em pouco tempo to cambaleando dentro de casa. Já são quase seis da manhã e estou desfazendo a mala, pendurando roupas molhadas e secas. Banho. Entro no quarto pra pegar o pijama. Dex acorda. Eu desço pra cozinha, morto de fome. Dex desce pra fumar. Ela quer que eu coma sanduíche e eu quero miojo. Ela quer que eu faça o miojo no fogão e eu faço no micro, que é como sempre fiz quando morava só no apê da Água Fria. Joguei aquele temperinho sobre a massa. Ela pergunta se ta bom. Eu digo que ta. Eu devoro aquela gororoba. Eu to na cama. Desabei.