sexta-feira, 8 de maio de 2009

Vai ver ele é o traficante e ela é a viciada?

Hoje fiquei na cama. Caralho. To em férias e todo dia tenho acordado no mesmo horário. Nove e meia, quinze pras onze. Hoje eu fiquei até onze e meia. Tem aquela papagaiada toda de orkut e Internet pra responder. E tem mala pra arrumar, pois tem show em Sorocaba. Dex me liga e ainda to aqui prostrado. Ela diz que ta com saudade. Que faz tempo que não me vê. Porra, nos vimos quarta. Ok. Também to com saudade. To mesmo. Ta começando a cair a ficha que ela vai viajar quinze dias. Claro que vou me divertir nos botecos, mas na hora que vir esta cama vazia vai ser ruim. Eu amo esta moça, porra.


Dei uma geral nas contas, em várias papeladas. Ligo pro Cavalo e sugiro que aproveitemos esta onda Raul e incorporemos umas quatro ou cinco músicas no bis, com figurino e tudo. Além de diferenciar o show, é sempre ótimo tocar Raul. Ele curte. Vamos testar tonight. Preciso arrumar algo pra comer. Fui.

Durante o banho, fico a matutar as hipóteses pra agora:

1 – Vou ao Pão de Açúcar, gasto menos, compro comida pra agora e pra de noite e depois dou um bode, sem me embebedar, ficando apto a fazer bem o show da noite.

2 – Vou ao Arcos da Cantareira, restaurante milenar da área, como bem, bebo uma Serra e tomo uma deliciosa caipirinha de vodka, sem chapar, e volto pra dar o bode.

3 – Vou pro Center Norte, como alguma coisa na Munique, bebo uma ou doze e vejo o filme do Wolverine.

Sei lá, mermão. A dois e a três colocam em risco minha integridade para o show, mas me permitem maior diversão. Gasto maior tb, mas foda-se: eu to de férias.

Terminei o banho. Me vesti. To no carro. Ele não quer ir pro mercado. Vou sentido Santana, levado pelo meu automóvel que agora tem vontade própria. Agora ou é Arcos ou Center Norte. A imagem do copo transparente com o limão e a vodka, o gelo e o açúcar, tudo isso invade meu ser. Ah, uma caipirinha de vodka! Eu odeio verde. Esta é a única coisa verde que me dá tesão...

To aqui na mesa do Arcos, local que freqüentei várias vezes em momentos distintos do passado, com meus irmãos e até meus pais. Periga encontrar um dos meus brothers. Tamos bem perto de minha antiga casa. Não, não. Eles devem estar trabalhando. Só eu é que to me embriagando pelas duas da tarde desta sexta.

Conheço boa parte dos garçons. Ainda.

Muito bem: quero esta maminha á brasileira, com farofa, fritas, arroz e molho de cebola, mais uma Serra Malte e uma capirinha de vodka. Traz pão, que eu vou chuchar (ou xuxar) no azeite com sal pra fazer a entrada. Enquanto o garçom vai atrás do pedido, começo a observar as redondezas. O salão tem pé direito alto e mais de duzentas mesas. Ocupadas, a maiora por casais, eu diria que são umas vinte. Só eu to sozinho. Duas mesas pra frente da minha está um casal curioso. Ela é loira tingida, tem cabelos presos, uma mini blusa roxa. Ele? Só vejo uma parte da cabeça e poderia ser uma versão tatuada do Mano Menezes. Sabe aquele cabelinho branco cortado bem rente á cabeça? 

Ok. Vejo tb seu braço esquerdo e como a camisa é curta, posso distinguir várias tatoos. Como um motociclista. Um Easy Rider da terceira idade. Ele é mais velho que ela. Ele tem uns quarenta e oito e ela uns dez menos. Ou menos. Chega meu pão. Pra baixo, com azeite e sal. Chegam a cerveja e o objeto do desejo, minha capirinha de vodka que ele prepara na mesa. Manda logo, caraio.

Peço fraquinha. Tem show hoje, porra. Já disse pra vcs: inventei esta banda pra encher a cara e agora, quando tem show, tenho que me controlar, senão...não tem show!

A loira tingida se levanta pra se ajeitar na cadeira e mostra uma tatoo pouco acima da bunda. Não sei o que é. Ela está sentada ao lado do cara e se joga tanto pra cima dele que sua cadeira poderia muito bem ser retirada. Isso não é coisa de casal casado. Este agarra-agarra parece chifração. Ela tem uma aliança na mão esquerda. Ele não. Hum.

A caipira ta legal. A breja tb. A minha frente chega um casal mais estranho: ela de vermelho, não muito bela. Ele de rosa, gordinho. Não, não. Vou me concentrar na loira tingida e no Easy Rider. Serão amantes? Amantes num restaurante não combina. Arriscado. Serão namorados descasados? Ela está se sentindo muito frágil ou tarada, porque está pulando em cima dele. Ela... passou o guardanapo nos olhos. Ela ta chorando. Certeza. Será uma despedida. O cara ta terminando com a amante? Ela é uma vendendora de roupas numa loja do shopping e ele tem uma loja de carros. Que tal? Eles tem um caso há anos e hoje ele terminou. Ela pediu mais uma chance e vieram no Arcos. Ele escolheu um lugar público para evitar cenas. Que tal? Mas ela ta chorando. Limpa constantemente os olhos com o guardanapo de pano. 

Minha comida chegou: dois bifes do tamanho da palma da mão, com pouco mais de um centímetro de altura, maminha. Arroz, batata, farofa á parte. Uma mocinha passa ao meu lado pelo corredor, sentido banheiro. Ela parece um belo modelo de peituda-bunduda. Uma letra "z", saca. Peitões pra frente e bunda arrebitada. Hum.

E o casal da frente? Ele é gay! E ela trabalha com ele e está apaixonada, mas não quer acreditar. Ela ta batendo os quarenta e se acha uma encalhada. E ele é gay enrustido. Mora com a família que não pode saber. Não, não. O cara é muito chucro. Ele ta de rosa, mas não é gay.

Carne boa. Caipirinha terminando. Eu bebo muito rápido. A breja também ta boa. Que porra quer dizer esta onda de "cereais não maltados" que tem em todo rótulo de breja brasileira. Que cereais são estes? Eu quero saber. Luciano "Patrícia" da Band jura que só tem nas brejas tupiniquins e que é isso que provoca dor de cabeça e ressaca, quando consumido em excesso.
A loira tingida se move e deixa outra tatoo, próxima ao ombro esquerdo, á mostra. Não sei o que é tb. Ela segue enxugando os olhos. Eu to comendo. A peituda-bunduda volta do banheiro. Belo exemplar. Não sou cego, Dex!

A comida ta descendo legal. Mandei um torpedo pra Dex dizendo onde estou e o que to comendo e bebendo. Olha a resposta:

- Q. blz!

Hoje é o último dia de trampo dela antes das férias. Ela deve estar feliz.

A loira tingida segue pulando em cima do Easy Rider. Não consigo ver a cara dele. Opa. Ela se levanta e vai ao banheiro. É mignonzinha. Ta claramente desconfortável. Ta se coçando, meio que se massagenado no trajeto do WC. Estranho.

Na mesa o Easy Rider se serve de cerveja. Bohemia. Ele não se ligou que tá com gosto de perfume. Ou gosta desta merda, mesmo.

Na TV, Fernandinha Vasconcelos ta com Angélica no Vídeo Show. Pouca gente sabe que antes da fama global ela foi garota do programa Fantasia que eu escrevia e onde fazia direção de palco. Fernandinha era (é) sobrinha de um contraregra e eles achavam que ela era meio vítima de preconceito em relação ás outras meninas. Ela sempre foi gentil e engraçada. Tinha uma outra mina que todo mundo achava que era sapata que pegava a Fê no colo e ela não curtia. Deus abençoe a Fê. Ela ta no topo. E no topo tem muita inveja e filhadaputice.

A loira voltou do banheiro. Ela ta se coçando, bocejando, parece uma pessoa com abstinência de drogas. Sentou ao lado do cara de novo e deu-lhe um beijo meio forçado. Algo não vai bem aí, porra. Mulher se esfregando assim, só pode estar insegura. Não ta com clima de tesão puro. Vai ver ele é o traficante e ela é a viciada? Pode ser? Sei lá. To terminando minha comida e já decidi: nada de cinema e mercado. Voltarei pra casa pra dar um bode.

A loira tingida tira o elástico que prende o cabelo curto. Ela pode ter menos que trinta e sete. Ta meio machucada. Meio Elba Ramalho, saca? To vendo ela de perfil. Parece mais bonita. Mas não ta bem.

Terminei. A caipirinha já acabou faz tempo, mas ainda tem breja. Tenho direito á sobremesa: salada de frutas ou pudim? Salada. Café não! Ele trás. Eu peço a conta. O Easy Rider pede tb. Quero ver este casal em pé, como caminham em relação ao outro. Pode ser uma pista do que ta rolando. Caralho, minha mesa parece um puleiro. Eu como igual galinha. Sujei e derramei tudo. Porra. Acabei a sobremesa. Quero café. Eu e o Easy Rider estamos pagando no mesmo momento. O quê? Treze reais uma caipirinha? Vai roubar assim no inferno. Vai tomar no cu! Esta smirnoff foi ordenhada da rainha da Inglaterra? Puta que pariu. O prato custou catorze e quarenta e a caipirinha treze. Nunca mais eu bebo esta porra aqui.

Opa, o casal se levantou enquanto eu bebo o café. O cara é pouca coisa mais alto que ela. Ta com as mangas da camiseta arregaçadas. Tem muitas tatoos pelos braços. Eles saem lado a lado. Dão as mãos. Eu dou mais um gole no café enquanto os perco de vista á saída do salão. Olho pela janela e lá vão eles garagem abaixo. Um Honda Civic Preto. É dele, claro. Ela entra e coloca uma blusa vernelha sobre a mini blusa roxa. Lá vão eles. Puta não era. Quer dizer, pode até ser, mas não tava trabalhando.

Acabou a novela. Fui. To pelado na cama. Siesta abençoada.

Acordo com Dex chegando, entrando, vibrando com suas férias. Ela marcou com as amigas. Paulona e Rita estão a caminho. Ela pede conselhos sobre onde ir. Eu digo que o "trashs 80" seria legal. Eu to indicando uma balada pra minha mulher ir com as amigas enquanto eu vou fazer show em Sorocaba. Me diga se não sou um marido bonzinho? Bem, a van já ta chegando. A mala já deixei pronta antes de ir almoçar, que não sou menino. É só me vestir e ir pra estrada. Rock'n'roll all nite, baby!

Dex saiu com as meninas. Banas entrou pra me pagar e aproveitou pra tomar um gole de vinho do Porto. Eu to ouvindo Johnnny Rivers e mamando uma Colorado Porter chamada Demoiselle, batizada com o nome de um dos protótipos voadores criado por Santos Dumont. Antes do Banas entrar, já meio inspirado pela cerveja, liguei prum dos meus irmãos e lhe disse que ele sempre foi minha referencia quando comecei a falar de putaria nas Velhas.

Coloquei duas Amsterdan, uma New Castle e outra Demoiselle num saco e tamos indo buscar o Tuca. Ele tava dormindo. Mas saiu rápido. Agora é ir pro point da Gabaju e zarpar pra Sorocaba. Cavalo adentrou à van com seus cobertores. Acho que ele pretende dormir. Eu pedi que Jorjão ligasse meu I-pod no som interno e vamos ouvindo sons variados da minha seleção pessoal. Juju tava atrasada por conta do trânsito na marginal nesta sexta feira em que dei um perdido na Band. A loirinha Fran, da gravadora, tb vai. Agora é só pegar Roy e Simon na casa do último e vamos. Cerveja comendo a rodo, bom papo. Backs sendo acendidos. Noise. Viagem divertida, ao som de Bezerra da Silva, Deep Purple, Zena Pagodinho, Ozzy. Este parece ser o nosso show mais estruturado numa boite em Sorocaba. Já fizemos um monte de bons shows no Black Sheep, que fechou. E fizemos um muito especial num espaço da prefeitura, junto com o Ira. Tinha muita gente naquele dia. 

Mas hoje a boite parece ser maior, a venda antecipada foi boa, o som é bom, o palco idem. Esperamos fazer um de nossos melhores shows aqui. Tamo no camarim. Muita cerveja. Frutas, tira-gostos, salgadinhos, sanduíches, vodka, rum e um liquidificador pra transformar estas frutas em batidas. Nosso barman é o Rico, que nas horas vagas produziu o palco do Raul na Virada e é tb iluminador. Tamos exultantes com a volta do nosso técnico de som oficial, Mr. Mauricio Carandiru, que teve adoentando e hoje volta á ativa. Isto é uma família e a gente se ama. Muitos abraços e beijos no Caran. O camarim é muito legal, mas ta sem água no banheiro. Vcs sabem que daqui a pouco eu vou cagar e a tendência, sem descarga, é que o ambiente fique fétido e inadequado pra vida humana. Rico saca uma batida de abacaxi. Depois vem uma de morango. Desce cerveja. Eta vida boa. Paulo Seidl, bom amigo de muitas paradas, aparece e brinda com a gente. Showtime.

Em relação aos sets anteriores, duas alterações: tirei "Mea Culpa" e coloquei "Deus é Pai". Assim, quando Ju sair após A Mulher do Diabo volto com a batina e sob ela o sutiã do Homem Lindo. O bis é homenagem especial a Raul e eu volto de Mago e depois segue o enterro.

São duas horas de show em casa. Tudo funcionou bem, especialmente as alterações. Tocamos "Abre-te Sésamo", "Aluga-se", "Sábio Chinês", "Conversa pra Boi dormir" e fechamos com "Rock das Aranha". Mentira. Como estávamos em Sorocaba não poderíamos esquecer o nosso hino bêbado da cidade: "aconteceu num sítio perto de Sorocaba..."

Autógrafos, fotos, beijos, abraços, rolou tudo. Paulo Seidl misteriosamente ganhou o sorteio de uma guitarra que todos autografamos. Como sempre fiquei falando com a galera além do tempo e Rico teve que me resgatar e jogar na Van. Volta animada como a ida. Eu, Tuca, Roy e Banas nos embebedando e nos embalsamando com a certeza de mais uma apresentação legal. Uma das melhores em terras sorocabanas. Fomos deixando todo mundo, no sistema pinga-pinga. 

Entrei em casa. Desfiz a mala e pendurei coisas molhadas. Banho. Quase oito da manhã. Eu preciso dormir. Fiz.