sábado, 2 de maio de 2009

- Boa noite, São Paulo. Levamos 23 anos pra chegar aqui

Dito e feito. Dex saiu do chuveiro, nuazinha como veio ao mundo e eu, como um X-Men, saltei sobre ela, deitei-a no solo e a fiz mulher, já diria Agepê. Amor confeccionado, tomei um chuveiro e ela tb, novamente. Fiquei na Internet até cerca de duas da tarde. No quarto de Juju e Mickey Rourke apenas um silencio sepulcral. Bati e nada. Eu e Dex resolvemos sair pra comer. Antes disso, deixamos na mesa algumas coisas que dariam preles encherem a barriga, tipo arroz, carne, maionese, estas coisas. Quando já estávamos saindo alguns ruídos me levaram a checar o que ocorria no andar de cima. Eles estavam acordando, mas a fome que se abatia sobre nós me obrigou a uma sentença definitiva:


- Ou vcs vem com a gente agora ou ficam por aí. 

Tem comida na mesa. A julgar pela lenta mobilidade de Juju ao lado da cama improvisada, não adiantaria esperar. Eles ficaram e nós saímos em busca de alimento na selva de concreto.

No caminho Dex se lembra que André queria fazer um rango em sua casa e liga pro homem que tem no lugar da cabeça uma caixa d'água. De uns cinco mil litros, eu diria. Vai rolar mesmo uma parada gastronômica e resolvemos passar no mercado pra comprar umas "coisinhas": cerveja, carne e Coca Zero. À parte eu compro algumas brejas importadas, entre elas Krombachers, Washteiners, Quilmes e algumas Eisenbahn. Será meu aperitivo antes do show da Virada Cultural. 

À chegada da casa do cabeça encontramos Lisandra, vascaína de coração, santista fajuta, amiga de colégio de Dex e do Cabeça e vizinha de cima. Está voltando de uma intrépida expedição ao Hopi Hari com seu filho Arthur que hoje ta com o pai. Todos vamos comer e beber no André's. Ele cozinhou um frango com batatas, cenouras, cebolas e sei lá mais o quê. Tem arroz tb, mas quem fez foi a Camila, sua namorada buzanfuda. Estamos comendo e bebendo. Tem skol e Brahma a rodo. Lisandra chega com mais cervejas. O papo engata por um lado meio exótérico: Dex está pra se engajar num lance de espiritismo e Lisandra parece ter experiência no assunto. 

A conversa passa das almas pro futebol com rapidez. Lisandra diz que é santista e vascaína na mesma medida. Mentira. Sei que ela é mesmo é vascaína. No fim ela admite. A trilha sonora vai dos chatos Mercedez Sosa e Gonzaguinha a Chico Buarque e a Clara Nunes. Estes últimos são legais. Era só pra tomar umazinha, mas desceram várias. Cavalo chega e a polêmica continua, sob risos e demência. São quase sete da noite e seguimos falando merda, analisando assuntos "político-esportivos- qualquer-coisa" com a profundidade e a isenção de uma mãe de família. Dex, Lisandra e Camila parecem ter resolvido ir apenas ao show do Raul na manhã de domingo. To meio breaco e isso não é o que eu tinha planejado presse dia de Virada Cultural. Rolou mesmo foi uma virada de cerveja. Simbora pra casa, pois Mickey Rourke e Juju estão lá trancafiados. Tem comida e cerveja, mas estão presos. 

Dex resolve comprar uns lanchinhos numa padaria próxima da casa do Cabeça. Enquanto ela entra eu observo as redondezas e lembro que já vi muitos rachas naquele local, isso antes de colocarem um canteiro no meio. Geralmente rolava de domingo á noite, após os bailes do Acre Clube. O manobrista da padaria me vê com a camisa do Timão e vem puxar assunto. Papo sobre o jogo de amanhã e tal. Digo que estarei no Pacaembu. Bora. Paro pra comprar gelo no posto. Breaco, brinco com um frentista meio mal encarado:

- Eu sou Corinthians – digo

Ele, sem o menor bom humor, diz que "ele é ele". Gelo no carro, ao pagar comento conto a outro frentista a brincadeira que fiz e a fria recepção do seu colega de trabalho. Ele comenta que o cara é mesmo seco e que não ri de nada. Comento, meio bêbado e visionário, que isso deve ser coisa que envolve mulher. O frentista ri e diz que estou certo.

To em casa. Monto minha mala enquanto convidados e Dex tomam lanche. Coloquei as brejas todas num isopor e gelo por cima. Deixei a caixa de isopor com brejas na saída de casa pra tropeçar nelas e não esquecer. Vou ficar quietinho pra melhorar. Tenho trabalho importante pra fazer tonight.

Ainda dormi cerca de uma hora até que o interfone avisou que Jorjão, o homem dos dois tiros, tava lá na porta.

Jorjão tirou o último banco e colocou nosso equipo todo lá. Mesmo assim, não sei como vamos agrupar tanta gente aqui. Sim, pois além da banda (exceto o Roy que foi pro palco rock bem antes, pra tocar no Tutti-Frutti com o pai), teremos uma galera que quer fazer umas gravações com a gente, não sei bem se um documentário, um vídeo ou uma espécie de reality. Tamos indo pegar o Tuca, Eu, a Juju e o Mickey Hourke. Tuca tava bodeado. Parece que depois da balada em Ilha Comprida, teve que levantar ás nove pra pegar os filhos. 

Início de separação pode ser uma coisa complicada, quando rolam picuinhas de parte a parte. Não estou dizendo que pegar os filhos é picuinha. Estou dizendo que o cara chegar do show ás seis e ter que estar em pé ás nove é um pouco desumano. Sinto dizer isso, meu bom amigo Tuca, mas depois da separação a gente conhece uma outra face da pessoa que, eventualmente, a gente amou. E não é muito bonita, não! Sempre lembrando que isso não é absolutamente da minha conta.

Tuca ta meio amuado. Disse que é por que tava dormindo. E tem seu ombro dolorido em função do mosh de sexta. É nóis na Gabaju. A moçada do vídeo compõe um grupo de cinco ou mais pessoas, não consigo precisar. Aí acontece aquele papo de descer da van e já ter gente te esperando com a câmera on apontada pra vc. Perguntas do diretor que nada tem a ver com conversas bestas e seguem uma linha investigativa. Mas, simbora, porra. Vamos tocar no maior palco da Virada Cultural, certamente pro nosso maior público na cidade e provavelmente na nossa história até então, já que o recorde foi uma participação no Quilmes Festival em, pasmem, Assuncion, Paraguai. Uma banda vagabunda como as Velhas Virgens só poderia ter recorde de público no Paraguai, eh, eh,eh. Não posso perder a piada, ainda que seja com a gente mesmo.

A Van ta parecendo metrô na hora do rush. Neste último banco estamos eu, Juju e Simon. No banco seguinte estão Cavalo, Tuca e uma pessoa da gravação. No banco que antecede o do motorista estão dois caras com câmeras e mais uma pessoa da produção deles. Eu não tenho como saber os nomes. Não sei nem o meu nome, caralho! Mickey Rourke ta na frente, ao lado do Jorjão e de uma mocinha loira que tem algo a ver com a vida íntima do motora e eu não tenho a menor intenção de saber que laços os unem. Não tenho dúvidas, no entanto, que eles trepam. Metem. Fodem. Fincam. Compartilham fluídos genitais.

É uma experiência diferente estar rodando pela cidade durante um evento como este que coloca atrações culturais as mais variadas em pontos centrais (e também nos bairros) e de graça. Tem um monte de palcos, cada qual com sua estética, espalhados por aí. Eu gostaria de poder ir ao palco do largo do Arouche pra ver a bregaiada. O palco do Raul, na Luz, onde vamos tocar tb, é outra coisa interessante. O do rock, obviamente, interessa muito. E no palco que eles chamam de principal, onde Maria Rita encerrará a Virada no domingo ás seis da tarde, parece que vai haver uma galera executando o Tim Maia Racional. Aqueles dois discos que ele fez com carinho e devoção e depois renegou. Li sobre isso na biografia do Tim recentemente. As pessoas amam idolatrar estas coisas renegadas, perdidas, pirateadas. Vai ver o Tim fez um disco além do seu tempo que só ta sendo compreendido agora. 

O que eu posso dizer é que esta merda de filosofia racional que se foda. Nenhuma ideologia mais me satisfaz. Vai cagar regra na casa do caralho, seja quem for. Papa, pai de santo, pastor, rabino. Minha pátria é a liberdade. Minha religião é Jesus, sem intermediários.

E com esse papo furado todo, tamos na área da Virada, no centro da cidade. Muita. Muita. Muita. Muita gente andando pra lá e pra cá, ambulantes, barracas de prestação de serviço da prefeitura. Policiamento intenso, marronzinhos orientando o transito. Bloqueios que fazem as ruas normalmente dedicadas aos carros virarem passarelas do povo. E como a multidão é imensa, passar com a van no meio é um trabalho de paciência. Tamos na Ipiranga, com gente pra todo lado e nóis no meio. O motora vai dando farol, andando com cuidado e vamos progredindo em direção do encontro com a São João.

"Alguma coisa Acontece no meu coração. Que só quando eu tomo um chopp no Brahma da avenida São João".

Poderíamos muito bem descer aqui e tomar um ou doze chopps no Brahma. Não dá. Banas, nosso empresário, surge na garupa de uma moto. Ele é um dos cabeças da organização da Virada Cultural. E como a gente não tem "peixe" em lugar nenhum, só somos convidados presses eventos se um de nós estiver envolvido. Não é por falta de público, não. É por falta de lobby, de armação, de conluio. A gente não puxa saco de vagabundo político nenhum. É a quinta Virada Cultural e só agora a gente vai participar. É bem verdade que ano passado tava tudo certo, mas eu tava com minha viagem pra Europa marcada um ano antes e não dava pra cancelar. Pra compensar, a gente toca duas vezes este ano. E sem precisar rastejar ou fazer rapapé pra ninguém. Nóis é nóis e o resto é bosta!

Banas vai meio que abrindo caminho com a moto. Quando já estamos bem perto do portão que dá acesso ao backstage do chamado "palco rock", a muvuca cresce e algumas pessoas se incomodam com a presença da Van. Um idiota começa a bater na lataria e a xingar. Banas vai lá atrás ver. Ele surge minutos depois dizendo que o cara puxou uma faca e tentou golpea-lo. 

Entramos para a da área de segurança do portão, onde só estão artistas, produção, convidados e imprensa. To preocupado com Banas. Ele diz que é "malandro" e se defendeu da facada. É pouco mais de onze da noite. Num corredor em "L" invertido e de cabeça pra baixo, estão vários banheiros á minha esquerda. À direita polícia e ambulâncias. O palco ta em frente e pro lado esquerdo estão três tendas brancas. A primeira pra produção e as outras duas para camarins. Nenhum deles está liberado pra gente ainda. O próximo show é do Camisa de Vênus, motivo da nossa chegada antes: eu quero ver o Camisa, meus ídolos de sempre e amigos tb. 

Mal desço da van, vou encontrando amigos, famosos ou não. Entre os famosos tão Luis Carlini e Rufino do Tutti. Sol, do Tutti tb. Clemente, Inocentes. Franklin Paolilo, ex-um monte de artistas, talvez o maior batera de rock que este país já teve. E, claro, os vagabundos do Camisa: Gustavo, Karl, Robério. Grandes abraços, grandes risadas. Robério me apresenta sua irmã Maria e diz que é aniversário dela. Pede preu sacanea-la no palco. Vou tentar lembrar. Eu esqueci de dizer que o Luis Carlini, pai do Roy, é tb do Camisa. Ficamos ali trocando idéias. Encontro Roy com sua mochila nas costas e seu inseparável amigo Dimitri. Levo Roy pra van, pra se livrar da mochila. 

Ele me diz que já tomou dois conhaques duplos. Cavalo tb passou a tarde bebendo vinho. Tuca está com o ombro meio dolorido. E eu não to como acordei. Isso faz com que metade da banda esteja de sobreaviso e meu cu trancado, diante de um palco enorme (o maior da Virada) e um show desta importância. Deve ser o show da nossa vida, até então. Pego a equipe de TV pela mão e os levo até a caixa de brejas importadas na van. Mostro a variedade, falo aquele papo furado sobre as diferenças e etc. E dou início aos trabalhos com uma Eisebahn. Os outros vão se servindo das delicias cervejeiras. Ta um puta clima legal. Sem que ninguém perceba, saio pela lateral do palco e vou até na frente, pra ter um visual do local onde vamos tocar. Algumas pessoas me reconhecem e pedem fotos, autógrafos ou só um aperto de mão. Porra, o palco é grande e tem gente pra caralho. Banas me falou que, por volta de nove da noite já estavam ali mais de 20 mil pessoas.

Marcelo Nova chega num carro com vidros escuros, aparentemente dirigido por ele. Eu o cumprimento á sua saída. Ela ta com a mulher e o filho Drake. Caralho, como Drake ta grande. Ele se foi pro camarim do Camisa. Eu fico zanzando, falando com as pessoas e bebendo as brejas importadas. Meu bom amigo do PSDB Fernando Guimarães chega acompanhado tb. A todo minuto a gente tromba os amigos e fica aquele papo furado de gente que não se vê faz tempo. Eu esqueço nomes. Sei quem são as pessoas, mas o nome não vem. É assim com a ex do Silvio Passos. Ela me sacaneia perguntando se sei quem ela é. Eu sei, só não lembro o nome.

A galera do Joelho de Porco ta por aqui. Sou fan do Joelho, mesmo depois da morte do Tico Terpins. Tem um cara de smoking que deve ser o primeiro vocal da banda, o ex-gordo Próspero Albanese. Mas ele fez cirurgia de estômago (acho) e ta tão diferente que não tenho cara de perguntar se ele é ele mesmo. Eles estão indo embora. Taí outro show que eu queria ter visto. Vcs talvez não acreditem, mas não me sinto um artista e sim um tiete aqui. Pra mim sou um penetra, neste desfile de gente que influenciou as Velhas e minha vida. E desce cerveja. 

O show do Camisa está pra começar. Me deu vontade de cagar, claro. To na privada do banheiro químico e lá no palco o locutor anuncia Camisa de Vênus na seqüência. E depois Velhas Virgens. Sem competições ou comparações, a vibração da galera ao ouvir nosso nome é maior. Eu não posso crer nisso. Eu to sentado na privada e lá fora os caras vibraram com o anuncio do nosso show. Porra. Além de merda pelo cu, vertem lágrimas dos meus olhos no escuro da caixa plástica de dejetos. Isso ninguém viu. Só vcs vão saber. To de volta e o Camisa ta no palco. Ta todo mundo aqui no backstage vendo a apresentação: Drake e a mãe, Sol, Rufino, todas as Velhas Virgens. 

O Camisa ta com Ivan Busic (Dr. Sin) na bateria, Luis Carlini na guitarra e os fundadores da banda Karl Hummel e Gustavo Müllen nas guitarras, Robério Santana no baixo e Mr. Nova no lead vocal. Marcelo faz questão de cantar antigos sucessos de uma forma diferente. A galera não liga e acompanha. Tem um mané em cima de um árvore alta pra caralho em frente do palco. Uma certa preocupação rola na produção, mas o Camisa segue avassalador. A presença do Luis Carlini, que toca na banda desde os anos 90, dá classe e peso aos solos. As linhas de baixo do Robério são simples mas firmes. Os dois guitarristas fundadores, meus amigos de coração, seguem fazendo bases e brigando entre si. Estas brigas são lendárias entre eles. E o Ivan desce a lenha com a competência de quem sabe o que faz. Karl me olha e sorri. Ele ama estar no palco. Me disse que ta estudando saxofone em Salvador.

- Velho, eu levanto, tomo uma cerveja e começo a assoprar o sax.

Fui pegar uma breja e aproveitei pra ver se já tínhamos camarim. Banas disse que sim e pedi que mandasse alguém levar nossas coisas pra lá, especialmente cerveja. Peguei uma garrafa de Quilmes e to aqui ao lado do palco, vendo os caras. O Ivan toca pra caralho. É bom vê-lo em ação. Carlini pai tropeçou e caiu, me diz Carlini Filho. Eu não vi. Alguém passa a mão na minha bunda. E me agarra por trás. É o Caio, nosso ex-guitarrista, que vai tocar no intervalo entre o Camisa e a gente, com seu trio de violões chamado Trezazez, executando acústicos do Iron Maiden. 

Saudades. Abraços. Dou cerveja pra ele.O show do Camisa segue. Marcelo sempre guarda hits pro final. Em determinado momento ele lembra que as pessoas andam saudosistas com os anos 80, como se tudo fosse uma maravilha. Ele diz que era uma merda. Que o presente do público é que consegue estar pior que o passado, por isso o saudosismo. Marcelo tem competência para falar o que quiser. Tem credibilidade. É, sim, uma lenda viva do rock brasileiro. Pode mudar arranjos, dar sermões, esticar discursos. Ele é o cara! E eu to nervoso de tocar aqui, na minha cidade, pra tanta gente, depois da banda que mais influenciou nosso trampo. 

Me levanto e vou pro camarim. Bebo mais uma. Simon ta aqui. Ju tb. Começo a me trocar. Ta cedo, mas só colocando a armadura preu me tranqüilizar um pouco. Galo, amigo dos caras do Camisa é da Gaviões e ta falando comigo. Estamos meio que combinando um encontro pra ver o jogo juntos no estádio. Claro que ele tb vai. Tem algumas pessoas no camarim. O pessoal do Los Goialez, que toca depois da gente, deixou as coisas aqui. No problem. Eu preciso cagar de novo. Pelo menos já to com minha camiseta de BDSM, com minha cueca samba canção vermelha "Sex Hot", minhas joelheiras e cotoveleiras. E descalço. Passo por Clemente e ele avisa Robério pra tomar cuidado com a visão infernal do "Paulão de cueca". To cagando de novo. De verdade. Isso é bom. Não cago no palco. Lá fora Marcelo terminou O Adventista, com o melhor refrão já escrito em língua portuguesa: 

"Não vai haver amor nesta porra nunca mais". 

O que é que falta? Hum. "Eu não matei Joana D'arc".

Terminou. To alongando no camarim. To nervoso. A galera da TV ta gravando. E eu to nervoso. Cavalo ta dando um bode na van. Tava meio chapado. Os minutos correm. Caio me pediu pra fazer a apresentação dos Trezazez. Nosso palco vai sendo aprontado atrás de um biombo azul, na frente do qual estarão os três violonistas. To no palco e a galera da frente me saúda, me chama de viado, pede cerveja, oferece bebida. Banas ta ao meu lado e argumenta pro macaco descer da árvore em frente ao palco. O cara, surprendentemente, acata e desce, lépido, ágil, como um símio de verdade. Ok. Lá vou eu dar uma de Mestre de Cerimônias:

- Chegou a hora de música instrumental nesta Virada Cultural. Esta é a galera do Trezazez e eles vão fazer alguns sons de uma banda que eu acho que vcs conhecem: Iron Maiden!

O pessoal vibra. Caio agradece com um sorriso. Os caras começam com Fear of The Dark e a massa parece curtir.Volto pro meu transe.

Subir no palco e falar com as pessoas me acalmou. Parece que estamos em casa. A cada final de música instrumental eu ouço coisas distintas. Lá fora o povo aplaude. Aqui atrás alguns ficam indiferentes e outros dizem que ta chato. Eu sou suspeito, Caio é como um irmão e to torcendo pra tudo dar certo.

Ai, meu caralho. Terminei meu aquecimento. Já virei Jack Sparrow da ZN. Saio e dou um rolê pra aliviar. Um visual chacriniano como este faz com as pessoas queiram fotos. Eu nunca tive medo de parecer ridículo. Ta divertido. Volto pro camarim. O som do Caio terminou. É noise. Todo mundo junto. Nosso brinde de urros guturais sem sentido ecoa. A galera sobe a rampa e eu fico andando de um lado pro outro feito tigre enjaulado, como sempre. Uma voz pede pra tirar fotos e, sem ver quem é, eu digo que agora, please, não! To no último minuto de concentração, falando com Jesus e Nossa Senhora. Pedindo que tudo saia como tem saído: bem!

Cubanajarra ta rolando. Subo a rampa rosnando. Entro com aquele desfile de capitão gancho menstruado de um lado pro outro do palco. Careta pro Simon. Chamo a galera. Puta que pariu. Energia sobe e desce pelo corpo na forma de arrepios. É muita gente. E tão com a gente.

- Boa noite, São Paulo. Levamos 23 anos pra chegar aqui. Temos orgulho de ser a maior banda independente do Brasil: Nós somos as Velhas Virgens!

Tuca puxa Rafaela. È nóis. Dou a latada na testa e a galera vibra. Os roadies colocaram um tapete especial preu fazer minha palhaçada e não molhar o chão pras outras bandas. Errei o lugar e molhei. Sorry, Pirata!

O som segue. Faço a referencia a "Rehab" e a galera responde em coro: "no, no, no". Este show ta mais que redondo. Eu não deveria ficar tão inseguro. Mas, como corinthiano e canceriano, tudo pra mim é mais sofrido. E eu amo muito tudo isso.

Emendamos "Pôe tudo". A galera veio na palma. Depois cantou junto. To berrando demais e não me ouço. Claro, fico na ponta do palco, longe dos retornos, como posso me ouvir? Na nossa frente, entre a grade e o palco, rola uma área vip que está lotada. Eu tinha até pensado em pular pra chegar perto das pessoas, mas não há espaço. Começamos "Tudo que a gente faz". O coro de milhares de pessoas vem junto. Em "Essa tal de Tequila" tive a sensação que menos gente cantou, mas a gaita sempre faz o serviço. Mandei uma gaita bends de presente. Pra introduzir a Ju, disse que, como bom amigo deles, eu tinha uma garota pra lhes apresentar.

- A mulher que tem o calor do inferno na buceta, a mulher que exala enxofre. Juliana, a mulher do diabo!

Ju ta no comando e eu desço correndo pra virar "O Homem Lindo". Peço ajuda do Galo pra colocar o sutian. Ele se atrapalha. Segue-se aquele diálogo besta de que ele já deve ter tirado muitos e ele respondendo que sabe tirar e não por. Ok. Desta vez entro já de viado completo, com óculos e boá. To atrás do palco. Juju terminou e eu entrei rebolando, no melhor estilo "dou o cu, e daí?". Sentei no retonro e cruzei as pernas. Uhu!

O pessoal brinca. Canta. Acabou. Rodrigo ainda ta tirando o sutian e Cavalo puxa equivocadamente, segundo o set, Siririca baby. Agora seria Madrugada e Meia. Simbora. O coro vem bem. Tem muita gente e com isso há um atraso na resposta das pessoas lá de trás. As vozes se misturam e eu tenho dificuldade pra reger a galera falando "Siririca" e "Eu toco bronha". Tuca entra e eu me localizo. É noise. Final apoteótico. Falo com a galera sobre estas leias anti-fumo, anti-bebida, sobre fecharem bares. Cito a frase do Bortolotto sobre comprar carne no morro, no dia que for proibida. Falo quem em breve vai ter toque de recolher. Culpo as bancadas religiosas. 

Puxo "Madrugada e meia". Os caras cantam. O set é mesmo mais curto. Só temos uma hora. Peço que Roy puxe direto o riff de "Abre essas pernas". Puxo as palmas que vem. A galera canta comigo. Com esta história de delay causada pela distancia, não deixo que eles cantam trechos muito longos, pra não atravessar com o som do palco. Parece o Aurora. Ta todo mundo cantando. Fomos até o fim em apoteose. É a última. Anuncio a participação de Caio Andrade na guitarra do Roy. Primeiro um teminha de gaita. Tuca faz frases demais e eu me perco na seqüência de oito (ou doze compassos de blues). Paramos. Faço aquela coisa de ir tocando a mesma frase na gaita cada vez mais rápido. Começo a canção e vamonóis. 

No final, uma surpresa: Caio começa a puxar aquela seqüência de riffs históricos que ele fazia antes de sair da banda. Com a entrada do Roy mudamos isso. Ele solta o riff de "Highway to hell" e, claro, o povo vem atrás. Ele fazia bem uns sete ou oito riffs, entre Iron Maiden, Deep Purple, Clash, sei lá. Na hora só me vem Metallica, que seria o último. Ele puxa e a coisa incendeia ainda mais. Porra, o que é que eu peço agora? Pink Floyd. É o apogeu da noite: isqueiros e celulares iluminam a platéia e a gente emenda este clássico emocionante. Puta que pariu, que lindo. Voltamos pro som. Roy pegou a guitarra do Cavalo e ele e Caio tão no palco.

- Eu só sei mesmo é beber!

É isso que o povo canta. A gente vai terminar. Ju fala no meu ouvido que podemos tocar mais uma. Sei que estamos atrasados. Cavalo me olha e como quem diz "vamos parar agora que ta tudo pra cima", me manda terminar. Acabou. Agradecemos abraçados. Saímos do palco nos beijando e abraçando. Público estimado em 40 mil pessoas. Nosso maior show, na nossa cidade. Deu tudo certo, graças a Deus. Bora beber.

Mas não muito, por que ás nove da manhã tem Raul. A bebedeira e os cumprimentos se seguem no basckstage. Fizemos nosso show de sempre, com um pouco mais de adrenaliana, quem sabe. Robério do Camisa ficou o tempo todo ali na frente e parece que curtiu. Queria muito que os outros Camisas tivessem visto. Marcelo, claro, se mandou, eu já esperava. Gustavo saiu fora por conta de sua sobrinha estar passando mal e deve ter levado Karl. Eles não se separam. Carlini ainda tava lá. Aproveitei pra sedimentar o convite prele tocar na nossa música do Corinthians, no próximo disco. 

Foi um belo show. Assinamos nosso nome na Virada 2009. Aposto que nenhum jornalista vai falar da gente. Foda-se. Quem tava lá (e eu estava) não vai se esquecer. Antes de voltarmos pra gabaju pra dar um bode até a hora do show do Raul, passamos do palco do "Maluco Beleza", na Luz, onde tocaremos daqui algumas horas, e deixamos nosso equipo. No caminho Roy pulou da Van com Dimitri e foi tirar o carro do estacionamento, prometendo nos encontrar na Gabaju ás oito. Aproveitei e fiz um reconhecimento do palco. Encontrei Sylvio Passos e lhe presenteei uma Quilmes de um litro. Alex Valenzi e os Hideway Cats estavam se apresentando, com meu amigo Caio Durazzo na guitarra. Queria muito ter visto. Mas tenho que dormir. Trajeto tranqüilo até a ZN. 

Opa, fui peidar e me caguei.

- Pare a van, Jorjão.

Ato continuo, ele me lançou um papel higiênico e cá estou eu, cagando em plena avenida Cruzeiro do Sul. Foi rápido.

Gabaju, here we go. Cavalo se aboletou no andar superior, onde costuma dormir. Juju e Tuca sobre os puffs da sala. Restou um puff pra mim. Mas, todo melado de breja e bosta, eu preciso tomar banho. Já asseado, mamo uma última breja e como pizza que sobrou do show de sexta. É péssimo dormir num puff. To com a bunda relando no chão frio. Tuca ronca. Juju ronca. Vou me juntar a eles nesta sinfonia. Já, já estaremos de pé, no palco de novo. 

É isso que mais gosto de fazer na vida.

EXTRA
Alguns vídeos da nossa apresentação já estão no YouTube: